Técnicos da Anvisa que analisarão a vacinação de crianças no brasil sofrem ameaças de negacionistas que sustentam discurso alinhado com Jair Bolsonaro. Ciência cobra agilidade para superação da crise
Autoridades sanitárias dos Estados Unidos a aprovaram hoje (29) a vacinação emergencial contra a covid-19 de crianças entre cinco a 11anos, que receberão o imunizante da Pfizer. Estudos divulgados pela Food and Drug Association (FDA), órgão similar à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) no Brasil, apontam que a vacina reduz em 90% das hospitalizações por covid nesta faixa etária. Outra vacina, a Moderna, também entrou com pedido de uso emergencial junto à agência americana, após estudos também concluírem pela segurança e eficácia em crianças.
Enquanto isso, influenciados pelo presidente Jair Bolsonaro, negacionistas enviaram e-mails aos cinco diretores da Anvisa que serão responsáveis por analisar a eficácia dos imunizantes em crianças brasileiras, com ameaças até de morte, para que não aprovem a medida.
“Deixando bem claro para os responsáveis, de cima a baixo: quem ameaçar, quem atentar contra a segurança do meu filho: será morto”, afirma o texto de um e-mail enviado aos cientistas, divulgado pelo portal G1. A Anvisa afirmou que já notificou autoridades policiais e o Ministério Público, entre outras instâncias, para que se tomem medidas contra os negacionistas.
Necessidade
Embora o negacionismo insuflado pelo presidente incomode, a comunidade científica comemora o avanço na vacinação de crianças. Isso, porque este grupo, mesmo mais resistente ao vírus, pode sofrer de complicações como a chamada covid longa. Também por se aglomerarem mais – na escola, por exemplo –, elas são vetores importantes de transmissão do vírus. Além disso, é necessário avançar a imunização por todas as faixas etárias. Isso para que se atinja o mínimo recomendado de 80% da população, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), para que o surto possa ser considerado sob controle.
Hoje, o Brasil tem 58% da população com esquema vacinal completo e 79% tomaram a primeira dose, segundo o Ministério da Saúde. Contudo, o país ainda um déficit de mais de 20 milhões de brasileiros que não retornaram para tomar a dose de reforço, tornando a imunização incompleta e insuficiente. A neurocientista e pesquisadora da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs) Mellanie Fontes-Dutra avalia que ampliar as faixas etárias para a vacinação de crianças pode ajudar no processo. “Um belo dia pra celebrar a ciência, ampliando a proteção para as crianças e somando ainda mais na luta contra o coronavírus”, disse, em referência à decisão do governo americano.
“Sabemos que os riscos da doença são grandes. Os EUA experienciaram situações trágicas envolvendo hospitalizações de crianças durante a covid-19. Até julho deste ano, mais de 16 mil crianças foram hospitalizadas e mais de 300 morreram no país. Faz sentido sim (também) pensar em efeitos da covid-19 nessa população a longo prazo. Crianças recuperadas estão sofrendo de covid longa”.
A covid longa é um conjunto de sintomas persistentes que duram meses após a infecção pelo vírus. Entre eles, síndromes perigosas que afetam especialmente os mais jovens. “As crianças correm o risco de desenvolver uma doença rara, chamada síndrome inflamatória multissistêmica (MIS-C), que envolve a inflamação de várias partes do corpo”, explica Mellanie.
Balanço
A covid-19 segue deixando vítimas em patamares elevados no país, apesar do considerável êxito da vacinação. Também hoje, o Conselho Nacional dos Secretários de Saúde (Conass) notificou 394 mortes, totalizando 607.462 desde o início do surto, em março de 2020. Também foram reportados 11.965 casos. Ao menos 21.793.401 pessoas foram infectadas no país. A taxa de mortalidade no país é 4,4 vezes superior à média global, e é o segundo com mais mortes pelo vírus no mundo, atrás apenas dos Estados Unidos, e líder de mortes em 2021. De acordo com levantamento da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (Unesp), 96% das mortes entre fevereiro e julho deste ano foram de pessoas não vacinadas.
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